Post by 7Figo on Jun 19, 2007 9:20:25 GMT
Um sete para a eternidade
Foram o último centro e a última assistência de Figo com a camisola de Portugal. A dois minutos da despedida. Para trás ficam 15 anos de encantamento, generosidade e profissionalismo exemplar. É o legado do maior líder de sempre da Selecção às gerações do futuro. No mesmo dia, Pauleta, amigo inseparável de Figo, anunciou também a despedida.
Figo, algum dia tinha de ser. Foi sábado, em Estugarda. Entrou a 15 minutos do fim, mas ainda a tempo de arrancar o cruzamento excepcional que permitiu a Nuno Gomes voar, acertar e aliviar a expressão da derrota com a Alemanha (1-3). Foram o último centro e a derradeira assistência de Figo com a camisola de Portugal. A dois minutos da despedida. Deus não dorme.
O público alemão, justo e conhecedor, tributou-lhe uma ovação quando entrou em campo. E quando o jogo terminou, não deve ter havido um adepto português que não tenha procurado com os olhos aquela camisola sete que nos empolgou durante tantos anos. E que não tenha agradecido intimamente: “Obrigado Figo.”
Porque é disso que se trata: agradecer a este futebolista excepcional que interpretou e honrou como ninguém a missão de representar Portugal. Nos treinos, nas concentrações, nos jogos particulares, nos jogos a sério, nas vitórias, nos momentos decisivos, nos maiores apertos e nas derrotas, Figo foi sempre a referência máxima de profissionalismo e dedicação à causa. Aquele que nunca nos deixou ficar mal. Aquele que foi sempre o primeiro a avançar e o último a render-se. Aquele que carregou tantas e tantas vezes a equipa e o país futebolístico às costas. Aquele que deu sempre tudo, mesmo quando já não podia dar mais.
Que extraordinário personagem futebolístico é este rapaz de cenho eternamente franzido, craque por nascimento e por trabalho (como tão bem o definiu Jorge Valdano) que Portugal aplaudiu pela última vez com a camisola grená. Foi pena o resultado mas nada apaga o passado e uma carreira gloriosa. Domingo passado, em Estugarda, despediu-se com simplicidade o único par de Eusébio e o maior líder de sempre da selecção nacional.
INDISCUTÍVEL PARA TODOS
Que se pode dizer da carreira de Figo que não seja do conhecimento geral? Pouco. Talvez dentro de uns tempos tenhamos uma noção mais exacta do que representou Figo para Portugal. Mas pode dizer-se que a Selecção nunca teve um jogador tão influente e tão preponderante durante um período tão alargado de tempo – quase 15 anos. Também nunca houve, com a excepção de Eusébio, um jogador tão respeitado pelos portugueses e tão indiscutível nas preferências do público e dos seleccionadores. De Carlos Queiroz, que o lançou a 12 Outubro 1991, continuando por Nelo Vingada, António Oliveira, Artur Jorge, Humberto Coelho, Agostinho Oliveira até Luiz Felipe Scolari, todos o consideraram imprescindível e inamovível. Todos. Scolari, nesse particular, esforçou-se muito para convencer Figo a regressar à Selecção depois da pausa ‘sabática’ por ele anunciada a 18 Agosto de 2004, no rescaldo da decepção com a Grécia. Um líder sabe reconhecer um líder e ‘Felipão’, lá no fundo, sabia que Figo fazia imensa falta porque... não era substituível.
Por isso, quando o sete anunciou o regresso por ocasião do decisivo Portugal-Eslováquia na Luz, a 4 Junho 2005 (2-0), foi com naturalidade que recuperou o seu lugar no onze e, mais importante, a liderança que nem Pauleta, nem Costinha, nem Deco (muito menos Cristiano Ronaldo) haviam conseguido exercer. Se dúvidas houvesse quanto à oportunidade do regresso de Figo – e houve quem torcesse ligeiramente o nariz – esse jogo dissipou-as por completo, tal o impacto do jogador na dinâmica da equipa.
Mais Figo, sempre tanto Figo. Nunca nos cansámos dele. 127 jogos e 32 golos com a camisola mais amada do País – 188 jogos e 50 golos, se contarmos com as selecções jovens. Nunca ninguém defendeu Portugal tantas vezes. Foi o único futebolista português presente em fases finais de cinco competições (alcançou uma final e duas meias-finais, além do título mundial no Portugal-91), num ror impressionante de honrarias e recordes que só Cristiano Ronaldo, se mantiver este ritmo, poderá igualar ou bater. Ainda Figo, em Estugarda: “Todas as gerações têm sido importantes para cimentar o prestígio da Selecção ao longo dos anos, mas a geração anterior foi importante para que possamos estar aqui e fazer o que fizemos”. A lembrança justíssima de Fernando Couto, Rui Costa, Jorge Costa, João Pinto, Paulo Sousa, Baía e Sá Pinto, entre outros, pelo último representante da ‘geração de ouro’ na Alemanha.
“O Luís será eterno”, disse Ronaldo, o futuro. Tem Cristiano toda a razão. O Figo, o nosso Figo, é património nacional. Um sete para a eternidade.
FIGO
- Figo estreou-se nos AA a 12 Outubro de 1991, num particular Luxemburgo-Portugal. Representou a Selecção durante 14 anos e 265 dias, capitaneando-a por 23 vezes. Em termos de longevidade, Figo é apenas suplantado por Vítor Damas (1969-1986; 17 anos e 65 dias) e Rui Jordão (1972-1989: 16 anos e 302 dias). O 32.º e último golo pela Selecção aconteceu a 3 Junho passado num particular com o Luxemburgo (3-0).
- Figo terminou com 127 jogos. É o 7.º futebolista europeu mais internacional de sempre, atrás do alemão Lothar Matthaeus (150); dos estónios Martim Reim (147) e Marko Kristal (143) e do sueco Thomas Ravelli (143); do romeno Dorinel Munteanu (130) e do dinamarquês Peter Schmeichel (129). Em Estugarda, Figo ultrapassou três grandes de uma assentada: Maldini, Zubizarreta e Hagi (todos com 126 internacionalizações).
- Figo é o único futebolista português presente em fases finais de cinco grandes competições – Euro’1996 (quartos de final), Euro’2000 (meia-final), Mundial 2002 (1.ª fase), Euro’2004 (final) e Mundial 2006 (meia-final); também é o recordista português de jogos em fases finais do Mundial (dez) e do Europeu (14), num total de 24 partidas em 25 possíveis. Seguem-se, largamente distanciados, Nuno Gomes, Pauleta e Costinha (todos com 15 jogos).
- Figo é o segundo futebolista com mais jogos internacionais na história do futebol: tem 256 (127 pela selecção; 129 em competições europeias + Taça Intercontinental) contra os 276 (126 + 150) do recordista italiano Paolo Maldini. Na próxima época disputa a Liga dos Campeões, com o Inter.
ADEUS 'AÇOR'
O Mundial da Alemanha era, para Pauleta, a última oportunidade de brilhar num grande palco internacional. Ele tinha consciência disso a partir do momento em que recusou trocar o Paris SG pelo Lyon e a oportunidade de jogar na Liga dos Campeões. Não correu bem: o homem que marcou onze golos em 12 jogos na campanha de qualificação repetiu o Euro’2004 e passou discretamente pelo torneio. Ficou-se pelo golo solitário frente a Angola, cortesia do amigo Figo, e um punhado de actuações esforçadas mas ineficazes. Paciência.
O percurso de Pauleta é verdadeiramente insólito: despede-se como recordista de golos da Selecção (47) sem nunca ter jogado na I Divisão portuguesa... nem num ‘grande’ europeu, embora seja o jogador mais acarinhado pelos adeptos do Paris SG. Em Estugarda, despediu-se com a sobriedade e parcimónia típica dos que nasceram humildes e não esqueceram as origens quando a fortuna jorrou à porta: e ele chegou a capitão da Selecção!
Em Paris, há um cartaz enorme de Pauleta na fachada da loja do PSG, em plenos Campos Elíseos. O facto de se poder ver retratado na avenida mais chique da Europa quando lá passa ao volante do seu Porsche Boxter nunca envaideceu o açoriano, embora ele tenha consciência de ser um motivo de orgulho indisfarçável para os 800 mil portugueses que trabalham na capital francesa.
Na Alemanha, o ‘açor’ perdeu a derradeira oportunidade de afirmar a categoria que nenhum ‘grande’ português reconheceu (quando estava cá) e nenhum ‘grande’ europeu quis aproveitar. A vida continua. Obrigado Pauleta.
PAULETA
- Pauleta despede-se com 88 jogos e 47 golos por Portugal desde que se estreou, a 20 Agosto de 1998. É o recordista de golos, acima de Eusébio (41), e sempre que marcou Portugal não perdeu. Esteve em quatro fases finais (Euro’2000, Mundial 2002, Euro’2004 e Mundial 2006), somando quatro golos em 15 jogos. Tem a sétima melhor marca entre os recordistas das selecções mais competitivas do Mundo.
10-07-2006